A preço de ouro: café pode se tornar artigo de luxo no Brasil e no mundo

16/03/2022 (Atualizado em 16/03/2022 | 12:09)


Este pode ser um dos anos mais difíceis para os apreciadores de café. A bebida, que é parte do cotidiano da maioria dos brasileiros tem se tornado um artigo de luxo. No Brasil, o produto acumulou a maior alta entre os alimentos no ano de 2021 – 56,87% de acordo com dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). De outro, eventos climático como geadas e a seca prolongada afetou toda a produção agrícola, mas especialmente a do café.

O resultado é um produto cada vez mais caro nas gôndolas dos supermercados. Dados do Departamento de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), em fevereiro, mostram que o preço do quilo do café subiu em 16 capitais brasileiras. As maiores altas foram registradas em Goiânia (7,77%), Vitória (5,38%), Aracaju (5,02%) e Brasília com 4,99%.

As consequências das mudanças climáticas quanto ao café também são sentidas na Europa. Na França, houve um aumento mais tímido de apenas 8%, mas como a população não está acostumada a inflação, o valor foi motivo de estranhamento.

Em entrevista a uma rádio francesa sobre o impacto do clima na produção de café, a meteorologista e pesquisadora brasileira, Ana Ávila, disse que a estiagem e o frio prolongado de 2021 desencadeou uma “confusão nas culturas”. “De forma geral, sim, as mudanças climáticas tendem a ter um impacto na produção de café.

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Exatamente por conta dessa bagunça naquilo que a gente conhece como sendo o normal do clima para produzir do jeito que a gente vem produzindo.”

Detalhe Lavoura de Café. Foto: Renata Silva/ Embrapa

Ana Ávila é pesquisadora do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultora, o Cepagri – Unicamp, que em 2008 realizou um cruzamento de informações agrário no Brasil com os cenários de mudanças climáticas estabelecidos por pesquisadores especialistas do clima da ONU, o IPCC.

À Radio France Internationale (RFI), Ávila disse que não somente a forma de produzir, mas a geografia das culturas também são diretamente impactadas.

O zoneamento agrário é um mapeamento que leva em consideração as características climáticas de uma região e de cada uma das culturas.

“O resultado dessa pesquisa foi que a tendência é que a produção do café migre mais para o sul, onde atualmente não plantam café, por exemplo”, disse.

Suco de laranja na mesa de poucos

Outro símbolo nacional, a laranja também pode se tornar cada vez mais escassa nas casas brasileiras. O clima é um grande desafio para a produção. De acordo com a associação de exportadores CitrusBR, a produção de suco de laranja no Brasil na safra 2021/22 foi estimada em 820,5 mil toneladas.

Foto: Piqsels

O número divulgado em fevereiro deste ano, indica uma redução de cerca de 2% em comparação com o ano anterior e representa o menor patamar desde a temporada 2016/17. Com a queda de 5% ante a previsão anterior, fica evidente os efeitos da seca e das geadas que atingiram as lavouras em 2021 na principal região produtora da fruta – São Paulo e Minas Gerais.

Uma das saídas adotadas por alguns produtores para enfrentar as longas estiagens foi a irrigação. Porém a técnica ainda é pouco utilizada no Brasil e aumenta os custos de produção, o que também contribui para o aumento do preço final.

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A meteorologista Ana Ávila ressaltou que tecnologias como a irrigação tem limites. “A gente não sabe até que ponto vamos ter essa água disponível e a gente tem prioridade para o uso dessa água.

Tem muita água lá na Amazônia, mas lá, felizmente, tem toda uma área de conservação, pouca população e a gente nem quer que seja explorada em termos de produção agrícola”, avalia.

Melhoria genética pode ser solução

Em 2013 uma reportagem sobre um hospital de Santa Catarina mostrou o depoimento de um senhor indignado, mas não com a situação da saúde em si e sim com a falta de café na sala de espera. Aos gritos de “Quero caféééé” ele conquistou os brasileiros que se identificaram com o sentimento.

E justamente para evitar que a bebida deixe de fazer parte do café da manhã dos brasileiros, a meteorologista do Cepagri, Ana Ávila, acredita que a solução está na melhoria genética dos grãos e frutas.

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Para ela, as plantas nativas do cerrado, por exemplo, poderiam ser usadas no melhoramento genético das lavouras. “São plantas adaptadas, são plantas nativas, são plantas do cerrado que podem ser usadas. Por que uma das questões, entre outras, é o melhoramento genético para ter grãos mais resistentes à seca, às altas temperaturas, para continuar essa produção”, explica.

Ávila disse, ainda, que o aproveitamento de áreas usadas para o cultivo é fundamental para evitar a expansão da agricultura para regiões protegidas. Segundo ela, muitas áreas cultivadas hoje são subutilizadas.

Fonte: Socialismo Criativo