Proteção da Democracia, tarefa que unifica a luta contra o retrocesso

07/06/2019 (Atualizado em 07/06/2019 | 18:07)

Carlos Siqueira
Presidente nacional do PSB

O Brasil enfrenta uma conjuntura política desafiadora, cuja natureza aguda precisa ser avaliada com serenidade, para que se possam vislumbrar cenários para a ação política. Para fins diagnósticos, deve-se observar inicialmente que o país tem alternado ciclos autoritários, e de predomínio da democracia ao longo de sua história republicana, sendo o atual o mais longevo, com seus trinta e quatro anos a contar de 1985.

A situação dramática com que o Brasil se depara não decorre, evidentemente, apenas do atual mandato presidencial, mas também de uma sucessão de eventos ao longo dos últimos trinta e quatro anos, que produziram uma vitória eleitoral em 2018,que traduz um desencanto com relação às virtudes da democracia representativa – fenômeno que se observa também em escala mundial.
Qual é o fator chave para entender a crise aguda pela qual passa o Brasil? Não há margem a dúvidas nesse caso. O principal fator a explicar o cenário atual está relacionado a uma CRISE POLÍTICA, cujo desenho mais preciso começou a se configurar em 2013. É evidente que o país já tinha problemas severos em seu sistema político antes dessa data, mas não se pode negar que este foi um marco claro, no qual a população expressou sua inconformidade com a situação existente, e que só fez agravar desde então.
Do que se tratava desde lá? Inicialmente de um grande desarranjo no sistema político e de suas instituições partidárias, cuja multiplicação jamais correspondeu às inclinações político-ideológicas efetivamente existentes no seio da população. Um mínimo de conhecimento de nossa evolução política recente permite indicar que com essa configuração se multiplicam as legendas de aluguel, que têm incidido negativamente sobre o processo político como um todo.
fragmentação partidária trouxe problemas correlatos, sendo que provavelmente o mais prejudicial está associado às complexas relações entre o executivo e o parlamento, que geraram práticas pouco republicanas, e adquiriram escalas tão expressivas, a ponto de contribuírem de forma decisiva para a degradação da percepção da população, sobre o sistema político como um todo.
Colocado frente a frente com a insatisfação popular, contudo, o sistema político acabou por adotar medidas defensivas, em lugar de atender aos clamores por mudanças expressivas em sua lógica de funcionamento. Desse modo, implantou-se uma reforma política extremamente tímida, que não atacava de modo incisivo o problema da fragmentação partidária, como que foram preservadas todas as tensões preexistentes.
Faltou desprendimento para implantar, por exemplo, cláusula de barreira de ao menos 5%, mesmo que a adequação fosse feita em um conjunto de duas eleições. Não se atentou devidamente para o fato de que, em universo de mais de trinta partidos, é difícil haver de fato alguma diferenciação política. Para o cidadão, portanto, sobram em geral “etiquetas”, sem que ele possa reconhecer no que objetivamente elas diferem.
A fragmentação partidária e a quase ausência de clareza político-ideológica contribuíram, ainda, para que se produzisse no Brasil um presidencialismo extremamente forte, mas que se vê obrigado a se relacionar com o Congresso Nacional muito mais na base dos “interesses”, em lugar de fazê-lo a partir de definições programáticas e convicções ideológicas.
O agravamento da crise política se deu por sinal através dessa via, da qual emergiram os mensalões, as cassações, as desqualificações de instituições como a Presidência da República e de seus mandatários, as práticas pouco republicanas de financiamento eleitoral etc.
A população desejava a mudança de paradigma e não uma reforma pontual e pouco abrangente do sistema político. A recusa reiterada do sistema político em se atualizar, agindo em conformidade com o clamor popular provocou um efeito extremamente grave: o descrédito da própria democracia representativa, pois o voto do eleitor pouco valia, no sentido de promover as mudanças almejadas na cultura política.
Foi justamente essa frustração com o sistema político e suas instituições partidárias que nos trouxe ao cenário atual, ou seja, a uma “renovação” radical de executivos e legislativos em todo o país. Tratou-se, contudo, de uma renovação de um modo geral para pior, e com regras que permaneceram praticamente inalteradas, reapresentando-se consequentemente os problemas e vícios decorrentes da fragmentação partidária – se é que eles não se tornaram ainda mais sérios.
Apresentado o quadro, o que se deve fazer? Inicialmente diminuir a quantidade de partidos, até que cheguemos a cinco ou seis instituições, com diferenciais políticos, programáticos e ideológicos facilmente reconhecíveis pela população. Um segundo ponto a considerar é a insuficiência da democracia participativa, que requer a intensificação do uso dos mecanismos de participação, já previstos na constituição – plebiscito, referendo, projetos de lei de iniciativa popular etc.
Por outro lado, a contumácia das crises geradas a partir das relações entre executivo e legislativo autoriza pensar, também, em uma mudança de sistema político, uma vez que o parlamentarismo sabidamente tem melhores condições para enfrentar as intempéries, sem que elas produzam abalos institucionais, ou conflagrem a sociedade civil em torno de posições políticas irreconciliáveis. É preciso considerar, igualmente, a adoção do voto distrital misto, porque ele também contribui para o fortalecimento do sistema político-partidário.


Fonte: PSB Nacional